Neste artigo vamos ficar a saber o que é o direito a desligar do trabalho, em que medida é que surge previsto na legislação portuguesa e, ainda, qual a sua importância para o bem estar e produtividade.
Este é um assunto particularmente importante numa altura em que, depois da pandemia, o trabalho remoto ou híbrido passou a ser a realidade de muitas empresas e trabalhadores. Para além disso, e com o digital muito presente na vida pessoal e no trabalho, é muito difícil estarmos 100% desligados de constantes notificações.
Assim, é pertinente dar a conhecer este direito, o que está previsto na lei e, especialmente, usufruí-lo.
O que é o direito a desligar?
O direito a desligar do trabalho consiste numa forma de impor uma separação clara entre a vida pessoal e profissional do trabalhador, a fim de o proteger, não só em termos psicológicos, como de saúde e bem estar.
Mais especificamente, trata-se de o trabalhador ver reservado o seu direito a não atender chamadas, ler e/ou escrever emails, ler e/ou responder a mensagens de telemóvel ou a conversas de redes sociais, que estejam relacionadas com trabalho, fora do seu horário laboral.
Já há alguns anos, mesmo antes da pandemia, países na Europa já tinham instituído, de alguma forma, uma lei que permite que esse mesmo direito se possa cumprir. Algumas empresas, cientes da importância de os seus funcionários se poderem desconectar do trabalho, já começavam a implementar esta política.
Desligar faz bem à saúde
Estamos mais propensos a sofrer de ansiedade e stress quando interrompemos, constantemente, os afazeres pessoais durante o tempo de folga para ler notificações ou responder a solicitações de trabalho. Ora, como é fácil adivinhar, ao efetuar trabalho a partir de casa, tudo isso tem tendência para se acentuar.
Em artigos publicados na BBC e Forbes, investigadores e especialistas na área da medicina comportamental enfatizam mesmo a importância de “desligar”. Esta é uma medida importante na preservação da saúde mental, para evitar o stress e, também, para chegar a formas mais criativas e verdadeiramente colaborativas de trabalhar.
Por isso, espera-se que num prazo relativamente curto de tempo possamos, um pouco por todo o mundo, instaurar definitivamente o hábito de nos desligarmos por completo do trabalho assim que passar a hora de saída.
O mesmo princípio se aplica a quem se encontra em teletrabalho. Torna-se mais importante ainda que estes trabalhadores possam separar de forma acentuada o tempo de trabalho do tempo em que não estão a trabalhar.
O direito a desligar está regulamentado pela lei portuguesa
A consagração na lei de um “direito a desligar do trabalho” tem gerado ampla discussão em Portugal há algum tempo. A lei portuguesa já previa o “direito ao repouso”, que pode ser interpretado também como o direito dos trabalhadores a desligarem do trabalho nas horas devidas. Isto porque se considera que o tempo que não está dentro do horário de trabalho é tempo para dedicar ao descanso.
Assim, o Código do Trabalho já referia que o empregador deve proporcionar ao trabalhador condições de trabalho que favoreçam a conciliação da atividade profissional com a vida pessoal.
Contudo, isso não chegava para considerá-lo como um direito inequívoco e regulado pela lei, no que toca especificamente ao ato de não receber e/ou responder deliberadamente a emails ou outras notificações eletrónicas.
Uma nova lei laboral, aprovada e publicada em Diário da República no final de 2021, passou a dar aos trabalhadores o “direito a desligar”. Em causa estão consequências negativas para as empresas que não respeitem o direito e contactem os seus colaboradores fora do horário de trabalho.
A lei diz que:
o “empregador tem o dever de se abster de contactar o trabalhador no período de descanso, ressalvadas as situações de força maior”;
“constitui contraordenação grave a violação” das leis do trabalho.
Assim, legalmente, em Portugal os trabalhadores adquiriram o direito a desligar os seus computadores e telemóveis ao final do dia de trabalho.
O exemplo francês
França foi o primeiro país a dar o exemplo, ao promulgar uma lei nesse sentido. A pensar especificamente no uso das ferramentas digitais, a lei considera que o trabalhador não pode ser acusado de conduta incorreta se não responder a solicitações de trabalho fora do seu expediente.
Prevê-se que outros países sigam as mesmas pisadas nos próximos tempos, tal como Portugal. Mas mesmo que os governos não o façam, admite-se que tal possa ser instituído por via de negociação coletiva.
O teletrabalho generalizou-se. O que está em causa?
A adoção do teletrabalho foi inesperada e contra todas as previsões, durante o período pandémico. O que está em causa a nível do direito a desligar do trabalho em Portugal é que se tornou urgente e fundamental garantir tratamento igual a quem trabalha em casa.
Mas não é só! Urge ainda combater os riscos potenciais de isolamento social. Para isso é necessário desenvolver ações específicas para mitigar os riscos psicossociais de se passar muito tempo isolado em casa, a trabalhar.
Sendo mais difícil para os trabalhadores em teletrabalho separarem a vida profissional da vida pessoal, o direito a desligar é uma importante medida política para limitar o período de trabalho e garantir o respeito pelos limites entre o foro profissional e pessoal.
No entanto, como ainda não se encontra regulamentado no Código do Trabalho, pode tornar-se mais difícil proteger os trabalhadores.
Direito a desligar: benefícios
Sem dúvida que é benéfico para os trabalhadores desligar do trabalho. Para as empresas, há também benefícios a médio e longo prazo.Isto porque se traduz num maior compromisso com o serviço, mais motivação e menos desgaste ou esgotamento dos trabalhadores.
Conheça mais benefícios desta prática.
Melhorar o desempenho no trabalho
O equilíbrio entre a vida pessoal e profissional é fundamental. Para que aconteça em pleno, deverá haver uma separação vincada. Ao conciliar trabalho e descanso de forma saudável, quem sai a ganhar são mesmo ambos.
Não acumular estados de humor negativos
Toda a gente que trabalha sabe que em há alturas mais difíceis e stressantes, decorrentes dos processo de trabalho em si e das relações entre as pessoas. Uma boa forma de dissipar essas energias é mesmo através da desconexão total.
Combater o vício de estar constantemente online
Obviamente isto não se resume à questão do trabalho, mas é um bom primeiro passo. Deve fazer um esforço para se distanciar da tentação de estar constantemente à espera de novas notificações no telemóvel.
É possível ser-se competitivo e altamente eficiente durante o horário de trabalho que nos é devido cumprir. Estender isso a 24 horas por dia, por mais estranho que pareça, pode fazer piorar o nosso desempenho profissional, ao trazer a saturação para o prato da balança.
Aumentar a frescura mental e de espírito sempre que se voltar a pegar no trabalho
Um trabalhador que regresse ao trabalho de cabeça fresca vai ter muito maior discernimento e disponibilidade para enfrentar uma nova jornada de trabalho.
Embora o direito a desligar do trabalho não exista oficialmente como um direito por si só, é possível viabilizá-lo, invocando algumas leis que já constam da legislação portuguesa.
Por exemplo, o artigo 29.º do Código do Trabalho, aborda a questão do assédio por parte do empregador. Assim, aqui pode englobar-se esta questão de não poder pressionar o trabalhador para estar ligado ao trabalho a toda a hora.
É possível ser mais produtivo a trabalhar remotamente
Se ceder a todas as tentações e resguardar-se de ser solicitado na sua casa enquanto trabalha, o facto de estar completamente descontraído no seu próprio habitat poderá dar-lhe uma outra concentração que num escritório poderia não ser possível.
Aproveite o facto de estar à vontade para dar o seu melhor em tudo o que faz.