Se está ou poderá estar na delicada situação de não ver o seu trabalho remunerado, saiba que a legislação portuguesa protege os trabalhadores, concedendo-lhes alguns direitos importantes. Em caso de salários em atraso, saiba o que pode fazer.
No artigo 11.º do Código do Trabalho podemos ler que o
contrato de trabalho é aquele pelo qual uma pessoa singular se obriga, mediante retribuição, a prestar a sua atividade a outra ou outras pessoas, no âmbito de organização e sob a autoridade destas.
Já no artigo 127.º, estão referidos os deveres do empregador, dizendo na alínea a) o dever de
pagar pontualmente a retribuição, que deve ser justa e adequada ao trabalho.
Como podemos concluir, a legislação estabelece que, se o trabalhador deixar de receber o seu salário, o empregador deixa de cumprir o contrato estabelecido com os seus trabalhador. Desta forma, o vínculo laboral encontra-se imediatamente posto em causa perante a lei.
Saiba, enquanto trabalhador, o que poderá fazer nesta situação.
O QUE PODE FAZER QUANDO HÁ SALÁRIOS EM ATRASO?
Na situação de falta do pagamento da remuneração devida, o trabalhador tem quatro opções disponíveis:
Suspensão do contrato de trabalho
Se a falta de pagamento se prolongar por um período de 15 dias após a data de vencimento, o trabalhador pode optar por suspender o contrato de trabalho.
Segundo o artigo 325.º do Código de Trabalho, os requisitos para o trabalhador avançar com esta decisão são:
- Informar a entidade empregadora relativamente à sua decisão;
- Informar a Inspeção Geral do Trabalho (IGT) sobre a decisão;
- Realizar estas comunicações com pelo menos 8 dias de antecedência relativamente à data em que pretende iniciar a suspensão.
Se o empregador, a pedido do trabalhador, emitir uma declaração escrita com a previsão de que a retribuição em falta não será paga até ao final do período de 15 dias, o trabalhador poderá realizar a suspensão do contrato ainda antes do referido período esgotar.
Se o empregador se recusar a emitir a referida declaração, a Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) deverá emitir o documento.
Durante o período de suspensão do contrato de trabalho, o trabalhador pode realizar outra atividade remunerada, devendo contudo manter o “dever de lealdade para com o empregador inicial”.
Cessar a suspensão do contrato
A suspensão do contrato de trabalho devido a salários em atraso pode cessar, nas seguintes situações:
- Caso o trabalhador comunique à ACT e ao empregador a decisão de terminar a suspensão a partir de determinada data;
- Com o pagamento de todas as retribuições em dívida e respetivos juros de mora;
- Mediante acordo entre trabalhador e empregador para regularização dos valores em dívida e respetivos juros de mora.
A Lei n.º 105/2009, de 14 de Setembro, capítulo VII, sobre a proteção do trabalhador em caso de suspensão de contrato de trabalho por não pagamento pontual da retribuição, determina, nos vários artigos, medidas que abrangem as seguintes situações:
- Casos especiais de direito a prestações de desemprego;
- Suspensão de execução fiscal;
- Suspensão de venda de bens penhorados ou dados em garantia;
- Salvaguarda dos direitos do credor;
- Suspensão de execução de sentença de despejo;
- Cessação da suspensão da instância;
- Sub-rogação legal nos direitos do trabalhador.
- Rescisão de contrato de trabalho por justa causa.
Rescisão de contrato de trabalho por justa causa
De acordo com o Código do Trabalho, artigo 394.º, a falta culposa ou não culposa de pagamento pontual da retribuição são razões para invocar a justa causa para resolução do contrato pelo trabalhador.
A legislação portuguesa atribui culpa à entidade empregadora quando há ordenados em atraso ao longo de um período de 60 dias e esta declara, a pedido do trabalhador, que não irá pagar o salário até ao fim desse período.
Havendo falta de pagamento pontual do salário, passam a existir motivos legais para a revogação do contrato por parte do trabalhador.
Se a falta de pagamento for por culpa do empregador, o trabalhador pode despedir‑se imediatamente, com justa causa, tendo direito a uma indemnização como compensação pelos danos causados pelos salários em atraso. Esta indemnização depende essencialmente do tempo de antiguidade na empresa.
Quanto à falta de pagamento não culposa: se as remunerações em atraso tem origem em alguma situação que escapa ao controlo empregador, a falta de pagamento é considerada não culposa. Neste caso, o trabalhador tem, na mesma, direito a terminar o contrato de trabalho, mas não terá direito a indemnização.
Para que o trabalhador possa rescindir o contrato por justa causa, alegando salários em atraso, é necessário respeitar os prazos certos para procedimentos que variam conforme for considerado se existe ou não culpa por parte da entidade empregadora.
O trabalhador, se rescindir o contrato por justa causa, tem direito a subsídio de desemprego, pois está enquadrado na situação de desemprego involuntário.
Reclamar juros de mora
Reclamar juros é outra opção no caso de ausência de pagamento pontual da retribuição por culpa do empregador. Este deve pagar ao trabalhador os juros de mora, calculados à taxa em vigor à data, ou a taxa superior fixada em Acordo Coletivo de Trabalho ou em acordo celebrado entre a empresa e o colaborador.
As ações de proteção disponíveis nos casos de salários em atraso estão previstas no Código do Trabalho. Segundo os artigos 325.º e 394.º, o incumprimento no pagamento pontual da remuneração, por período de 15 dias ou 60 dias após a data do seu vencimento, permite que sejam acionadas algumas medidas, quer pelas autoridades laborais (ACT) quer pelos trabalhadores, de forma a evitar o prolongamento dessas situações.
Recorrer ao Fundo de Garantia Salarial
O Fundo de Garantia Salarial foi criado para assegurar o pagamento das dívidas dos empregadores aos seus trabalhadores, nomeadamente quando as empresas se encontram em situação de insolvência ou a atravessar uma grave crise financeira. A ele podem recorrer os trabalhadores por conta de outrem.
Este fundo aplica-se não só aos salários em atraso, mas a qualquer tipo de dívidas, como subsídios de férias, de Natal ou de alimentação, ou ainda a indemnizações decorrentes de cessação do contrato de trabalho.
Para o obter, o trabalhador deverá dirigir-se à Segurança Social, no prazo de um ano a contar do dia seguinte aquele em que cessou o contrato de trabalho.