Vivemos na era do barulho constante. Notificações, vídeos curtos, áudios, abas abertas e conversas simultâneas formam o novo fundo sonoro da vida moderna. Além disso, o cérebro, que evoluiu para alternar entre períodos de atenção e descanso, agora opera em estado permanente de alerta. O resultado é uma mente fragmentada, sempre ativa, mas raramente presente.

Por que isso é importante

A atenção deixou de ser um recurso individual e tornou-se uma questão cultural. No Brasil, um estudo mostrou que as pessoas passam, em média, 56% do tempo acordado em frente às telas de smartphones ou computadores quase nove horas por dia . Entre crianças e adolescentes de 9 a 17 anos, a pesquisa TIC Kids Online Brasil revela que 93% são usuárias de internet e 83% possuem perfil em ao menos uma rede social.

Em contextos de estudo, trabalho e vida pessoal, isso se traduz em um novo tipo de bloqueio. Não é falta de vontade, é incapacidade de sustentar o pensamento. A dificuldade de ler por mais de cinco minutos, de acompanhar um raciocínio contínuo ou de se desconectar do celular por alguns instantes não é preguiça  é sintoma de um ambiente cognitivo que nunca desliga. Consequentemente, o cérebro passa a confundir movimento com progresso, e o tempo dedicado nem sempre resulta em aprendizado real.

O que está em jogo

Pesquisas em neurociência já mapeiam o impacto desse comportamento. Embora os estudos brasileiros ainda não forneçam todos os números, os dados sobre tempo de tela indicam que a mente não tem descansado de fato. Além disso, a multitarefa digital reduz a eficiência da atenção, fragmenta a memória de trabalho e dificulta a consolidação de aprendizagens profundas.

No Brasil, adultos que em lazer usam três horas ou mais diárias dispositivos como celular, computador ou tablet aumentaram ao longo dos anos  as capitais registraram média de 1,7 hora para 2 horas por dia entre 2016 e 2021 . Esse cenário explica o fenômeno contemporâneo do “cansaço sem pausa”. Trabalhamos e estudamos mais, mas sentimos que rendemos menos. O cérebro consome energia para alternar entre contextos e, a cada troca, perde pequenas fatias de atenção que dificilmente são recuperadas.

Com o tempo, o ruído constante vira o novo normal. Por outro lado, o silêncio passa a causar incômodo. Nesse ciclo, o descanso mental deixa de ser percebido como necessidade e passa a parecer perda de tempo o que, em longo prazo, afeta produtividade, criatividade e até saúde emocional.

Como responder a esse desafio

Recuperar o foco não é retroceder, é reaprender a pensar com profundidade. Portanto, o primeiro passo é reconhecer que atenção não é infinita e precisa ser protegida. Práticas como reservar períodos de imersão sem interrupções, desconectar por intervalos regulares e evitar o acúmulo de microestímulos ajudam a restaurar clareza cognitiva.

Vale também ajustar os ambientes de estudo ou trabalho. Salas com menos estímulos visuais, pausas estruturadas e dispositivos que permitam concentração real elevam a retenção de informações em até 30%. Embora este valor seja mais citado em estudos internacionais, ele serve como parâmetro prático.

Além disso, instituições de ensino e empresas têm papel crucial nessa transição. Cabe a elas oferecer formação contínua, garantir proteção de dados conforme a LGPD e incentivar o uso responsável da tecnologia. O foco não é o oposto da velocidade  é o que dá direção a ela. Recuperar o silêncio mental não é voltar no tempo, é liberar o espaço onde o pensamento volta a ter voz.

O que você precisa saber
  • A hiperconexão transformou a atenção em um recurso escasso e disputado.
  • Adultos no Brasil passam em média nove horas por dia em frente a telas; crianças e adolescentes têm 93% de uso de internet e 83% perfil em redes.
  • Excesso de estímulos reduz memória, concentração e profundidade cognitiva.
  • Foco não é apenas disciplina, é preservar clareza e presença.
  • Recuperar o silêncio mental é uma forma de resistência cultural ao ruído digital.
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